O artigo de Julho no tema engenharia rural, onde se divulgou um estudo sobre a transição para não-mobilização, gerou alguma discussão. Fomos em busca de explicações mais detalhadas sobre a transição para a agricultura de conservação.

Numa série de artigos de divulgação, os professores da Universidade de Évora Mário de Carvalho e Ricardo Freixial explicam do ponto de vista agronómico e da ecologia do solo o que se passa quando se mobiliza ou não o solo. Assim pensamos poder contribuir para esclarecer melhor porque faz sentido ponderar esta mudança.

Um dos pontos mencionados com maior frequência quando se apontam dificuldades na transição para a agricultura de conservação tem a ver com a compactação do solo. Estes dois cientistas explicam que não basta parar de mobilizar. A maquinaria usada e a escolha da época para entrar no terreno têm também uma enorme influência nos resultados nos primeiros anos. Num artigo onde comparam os resultados no mesmo solo após 2 anos e após 10 anos de agricultura de conservação, mostram como ao fim de dois anos a porosidade do solo aumentou, com impacto na infiltração de água, no volume a ser explorado pelas raízes das culturas e consequente capacidade das culturas em absorver água e nutrientes.

Então como é possível que se reportem maiores compactações? Os investigadores de Évora, após vários anos de análise de solos, referem que só se poderá estar a confundir compactação com coesão (sendo esta última um entrave às alfaias de mobilização, mas não à proliferação de raízes e povoamento de microrganismos ou minhocas). Uma explicação, parece-nos que pode estar relacionada com a entrada de máquinas. Se num solo mobilizado é claro quando não se pode entrar, por exemplo, quando é obvio que um tractor não consegue transitar. Num solo não mobilizado, será de esperar que ocorra à mesma uma elevada compactação com a entrada de maquinaria pesada. Apesar disto, a transitabilidade tente a ser melhorada com a agricultura de conservação, já que existe melhor infiltração da água e uma melhor estrutura do solo.

Outro ponto muito discutido tem sido a redução da produtividade das culturas. Os estudos internacionais, dos quais se destacam muitos autores brasileiros, mas também grandes ensaios de campo nos Estados Unidos realizados pelo Departamento de Agricultura desse país, reforçam que a agricultura de conservação promove a fertilidade dos solos e a produtividade das culturas. No entanto, muitos apontam para a grande importância dos agricultores e técnicos no sucesso da transição. Na variedade de solos e climas pelo mundo fora onde a agricultura de conservação tem sido aplicada, o factor comum no sucesso ou insucesso é humano. A adaptação a um novo sistema de agricultura exige adaptação a novas formas de trabalhar e alguma afinação.

De facto, ao rever resultados de ensaios, o que se verifica é sempre um aumento muito significativo do teor de matéria orgânica, podendo até duplicar, com uma grande influência na melhoria das características físicas do solo. Já as características químicas não têm uma melhoria tão visível e significativa, o que poderá justificar a desconfiança de muitos agricultores.

O Professor Augusto Correia do ISA partilhou um dia a sua constatação de que a sociologia é da maior importância no trabalho do agrónomo. Em muitas discussões técnicas me lembro disto. No caso da agricultura de conservação, parece-me que por vezes existe acima de tudo uma enorme resistência sociológica: como pode um lavrador não lavrar?

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