Em Fevereiro de 2019 alertei-vos para a importância da teoria dos jogos, e da actualidade do último livro de Jean Tirole para o grande público sobre este tema. Nesse post, que podem recuperar aqui, relembrava-vos que a teoria dos jogos é a modelação matemática da interacção estratégica entre diferentes agentes individuais, cada qual buscando
o seu máximo bem-estar, que resultará no melhor equilíbrio para a sociedade como um todo – o equilíbrio de Nash.
Retomo esta linha de pensamento, com uma aplicação à agronomia usando esta metodologia, desta feita com um projecto coordenado pelo investigador do INIAV, Seita Coelho, com o fim de modelar a melhor estrutura do montado Alentejano.
O problema modelado é o de seguinte: um montado de sobreiros ou de azinheiras com uma extensão apreciável, i.e. a partir de um dado limiar de centenas de hectares será certamente rentável, mas qual a densidade ótima do montado? Segundo Seita Coelho, os sobreiros e as azinheiras ocupam respectivamente uma área de 736 000 hectares e de 465 000 hectares em Portugal, concentrados no Alentejo.
Mas, eis o verdadeiro dilema: muitos dos sobreiros e azinheiras encontram-se isolados. Logo, aqui nasce o conflito entre o individuo (sobreiro ou azinheira) com a sociedade (o meio ambiente que o envolve), muitos agricultores e agrónomos optam por abatê-los, por não os acharem rentáveis face à opção do olival intensivo. Neste caso a equipa de Seita Coelho do INIAV modelaram as condições edafo-climáticas, biológicas, agronómicas, económicas, sociais e politicas que tornam um individuo (sobreiro, ou azinheira) rentável face à sociedade, nomeadamente face à sociedade do olival intensivo.
Para os puristas da teoria dos jogos (humana) esta abordagem poderia não fazer sentido, porque os agentes (indivíduos, entenda-se árvores) nesse caso não são racionais. De facto, uma árvore não é racional, mas maximiza o seu bem-estar, logo entra na hipótese do “As if”, “como se” fosse racional de comportamento maximizador de Chicago, subjacente à teoria dos jogos convencional. Ou seja, de facto há modelos e engenharia racional, nomeadamente a teoria dos jogos que explicam que é racional ter um sobreiro isolado e ser rentável a médio e longo prazo, mas que esse limiar existe e é calculável. No fundo, trata-se da função de melhor resposta, estratégia ótima do individuo perante toda a sociedade (estratégia dominante), e vice-versa, para cada individuo (árvore). Neste caso, naturalmente, o agricultor/agrónomo terá a racionalidade de usar o modelo para compreender o resultado e tomar a melhor decisão de suster ou não o montado com o seu sobreiro ou azinheira (os tais chaparros isolados).
Daqui se depreende que poder-se-á extrair uma política pública agronómica de apoio a uma dimensão/densidade ótima do montado isolado, com consequências ótimas a longo prazo. A matemática é um mero instrumento de arte de engenharia agronómica, para a intencionalidade da racionalidade humana.
A pensar e repensar. Vale a pena explorar isto. Porque tem racionalidade humana e optimalidade económica e de engenharia agronómica.
Miguel Rocha de Sousa, Economista, Universidade de Évora.
Para saber mais sobre estes conceitos, fica aqui o artigo de divulgação do Público sobre a investigação de Seita Coelho
E, de novo, o livro de Jean Tirole, “A Economia do Bem Comum“.
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