Em todo o mundo da viticultura parece haver um movimento em direcção a práticas mais amigas do ambiente, incluindo menor consumo de agroquímicos e de água e menor desestabilização do solo e meio circundante. Para além da preocupação com o meio ambiente e possíveis contaminações químicas que possam chegar ao produto final, existe ainda uma atenção aos possíveis benefícios que a redução do uso de agroquímicos possa ter nos compostos que se formam durante a vinificação. Compostos este que afectam a cor e os aromas. Esta tendência parece ter particular significado em produtores de alto valor acrescentado, com mercados muito exigentes.

Um grupo de investigação italiano, da Universidade de Bolonha, tem vindo nos últimos anos a estudar os efeitos das práticas agrícolas na proliferação de leveduras no campo e nas propriedades químicas e sensoriais das uvas produzidas em diferentes sistemas. Em particular, têm-se centrado no estudo de vinhos obtidos em agricultura biológica e em agricultura biodinâmica. Uma das práticas mais visíveis da viticultura biológica é o uso de fungicidas à base de cobre que, apesar de terem um impacto no ambiente mais baixo que as moléculas orgânicas, ainda assim reduzem a população de leveduras e fungos benéficos que ocorrem naturalmente na superfície das uvas. Já a agricultura biodinâmica é um conjunto de práticas baseadas na tentativa de tornar o sistema autossustentável, sem recurso a factores externos, e no uso no solo de preparações fermentadas, com vista a sustentar um equilíbrio entre os vários níveis da cultura.

A crescente procura por vinhos diferenciados, com maior relação com as regiões onde são produzidos e seus terroirs, aumenta o interesse pela microflora associada a cada casta, em cada região e ao potencial que leveduras e outros fungos poderão ter no desenvolvimento de aromas específicos de cada região. Neste enquadramento, surge o interesse por conhecer o efeito da agricultura biológica e da biodinâmica nestes organismos e no potencial que poderá existir para a vinificação. De facto, estudos anteriores já identificaram a permanência de leveduras que não Saccharomices em diferentes fases da fermentação, produzindo metabolitos secundários que contribuem para o sabor e aroma do vinho.

De modo a avaliar o impacto das práticas agrícolas na população de leveduras e seus efeitos nos vinhos, foram realizadas fermentações tanto com auxílio de leveduras comerciais como espontâneas em uvas dos dois sistemas de agricultura. Os investigadores avaliaram a população de leveduras em cada tipo de uvas e nos mostos, ao longo da fermentação. Também analisaram quimicamente os vinhos obtidos nos diferentes tratamentos, concluindo que se a população de leveduras estava directamente relacionada com o tipo de sistema de agricultura, já a composição química do vinho era principalmente afectada pelo tipo de vinificação.

Um dos resultados interessantes foi não ocorrência de S. cerevisiae nas uvas, em ambos os sistemas. No entanto, ao longo da fermentação espontânea, esta espécie foi proliferando enquanto outras leveduras foram desaparecendo dos mostos. Ao fim de 11 de dias de fermentação espontânea apenas se observava S. cerevisiae nos mostos de agricultura biodinâmica, mas nos mostos de agricultura biológica a 60% das leveduras eram S. pombe, enquanto os restantes 40% eram S. cerevisiae. A S. pombe tem a particularidade de transformar todo o ácido málico presente em etanol e também está associada à produção de glicerol.

Vários estudos têm identificado a importância de outras espécies que ocorreram na fermentação espontânea: em particular, Metschnikowia pulcherrima está associada com aromas mais intensos e com actividade antimicrobiana em relação a espécies indesejadas; também a levedura Issatchenkia terrícola está associada com características químicas interessantes dos vinhos.

 

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