O Sul da Europa, com o seu particular clima mediterrâneo, apresenta desafios aos produtores agrícolas e aos melhoradores. Um interessante desafio, que muitas vezes é subestimado, é o de produzir bovinos, dadas as características fisiológicas destes animais.

Os bovinos europeus, Bos taurus taurus, são definidos na generalidade das raças como animais cuja zona de conforto térmico se situa entre os 0oC e os 16oC. Uma vez que durante o Verão, se podem passar vários dias em que as temperaturas mínimas se mantêm acima dos 16 oC, podemos então supor que os animais sofrem algum tipo de stress térmico, com efeitos que se poderão sentir na produção. Com base nesta observação, o artigo que referimos esta semana foi comparar de que forma quatro raças bovinas reagem ao stress térmico.

Com recurso a câmaras climáticas, os ensaios visaram comparar o comportamento e fisiologia de animais de duas raças autóctones, Mertolenga e Alentejana, e duas exóticas, Frísia e Limousine.

Após habituação dos animais às câmaras, de modo a isolar qualquer efeito adverso desta alteração nos seus hábitos, foram então realizados os ensaios. Estes consistiram em três períodos, com diferentes condições de temperatura e humidade relativa: no primeiro, de três dias a temperatura manteve-se a 16,5oC e a humidade a 45%; no segundo período, de stress térmico, com duração de seis dias, entre as 8 da manhã e as 16:30, a temperatura do ar era de 36 oC e a humidade 45% e nas restantes horas a temperatura descia para os 26,5 oC e a humidade subia para 65%; por fim no terceiro período, durante quatro dias os animais voltavam às condições neutras do primeiro período. A alimentação era fornecida duas vezes ao dia, de manhã e à tarde, sem limite. E a água estava sempre disponível de forma automática.

A avaliação dos efeitos do calor nos animais foi realizada através da monitorização das frequências respiratórias, temperatura rectal, análises ao sangue (para quantificar cortisol, tri-iodotironina e tiroxina).

Os níveis de cortisol indicaram que todos os animais estavam isentos de stress psicológico, o que de outra forma poderia afectar os resultados dos ensaios. Quanto aos dados obtidos durante o período de temperatura ou humidade elevadas, observou-se que a frequência respiratória aumentou para os indivíduos das quatro raças, sendo maior a frequência na raça Frísia, a única onde também se observou aumento da temperatura rectal acima de 40 oC. No entanto estes animais não tiveram redução significativa da ingestão de alimentos, ao contrário dos da raça Limousine, onde também os níveis da hormona tri-iodotironina baixaram. O mesmo decréscimo ocorreu na raça Alentejana sem, no entanto, isto significar que esta raça não seja bastante tolerante às temperaturas elevadas. Já na raça Mertolenga, o aumento da frequência respiratória foi suficiente para manter a temperatura corporal e a redução da ingestão de alimentos foi baixa, indicando que esta raça está realmente mais bem-adaptada ao clima mediterrânico e às temperaturas elevadas, tendo uma capacidade de suportar altas temperaturas semelhante a híbridos entre bovinos europeus e tropicais (B. taurus x B. indicus).

Com este estudo, verifica-se mais uma vez o interesse das raças autóctones e como a menor dimensão da raça Mertolenga pode ser uma vantagem evolutiva.

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