Nos últimos meses tenho dedicado bastante tempo e especial atenção ao fenómeno da globalização, em especial ao seu impacto nas economias emergentes. E notei que por aqui, no Núcleo Agri, ainda não se tinha falado sobre o quanto a economia mundial tem mudado, nem como as mudanças têm impactos tão diferentes em diferentes países.
Para os europeus, dos efeitos da globalização na agricultura destacam-se geralmente o acesso a uma enorme diversidade de produtos, vindos das mais variadas origens. Preocupamo-nos enquanto consumidores com a pegada ecológica, ou com o controlo de qualidade, mas também aproveitamos da possibilidade de consumir certos alimentos fora da época, ou exóticos. Do ponto de vista dos agricultores, existe principalmente a preocupação com a concorrência de países com custos de produção baixos.
Nos países em desenvolvimento, no entanto, tanto a abertura dos mercados como a melhoria das condições económicas das suas populações, têm impactos bastante diferentes e originam outros tipos de preocupações.
Uma das principais preocupações somos nós, os europeus. Ou melhor, a PAC. De facto, enquanto a Europa negoceia a abertura dos mercados ou a redução de tarifas de importação, em economias emergentes existe algum sentimento de injustiça quanto ao facto de a agricultura europeia ser altamente subsidiada, o que acaba por ser entendido como tarifas e taxas encobertas aplicadas aos países importadores de produtos agrícolas europeus. No entanto, para os agricultores europeus os apoios são essenciais à manutenção de um modo de vida que justifique a permanência no campo.
Num livro famoso de 2002 – “Kicking Away the Ladder” – o economista Sul-Coreano Ha-Joon Chang defende que os países desenvolvidos impedem os países em desenvolvimento de ter acesso aos mesmos meios que eles usaram para se desenvolver. Do ponto de vista figurativo: para atingir os seus objectivos usaram escadas que agora não deixam os outros países usar. Estas escadas foram meios de produção altamente poluentes, tarifas à entrada de importações, subsídios à produção e apoios à exportação.
Em alguns artigos recentes de investigadores sul-africanos verifica-se a mesma preocupação com as políticas norte-americanas e europeias. No caso da África-do-Sul, a situação tem contornos particulares, pois a globalização e os acordos da Organização Mundial de Comércio são contemporâneos com a transição para a democracia, que gerou enormes transformações na vida das populações rurais. Neste caso extremo, as sanções externas levaram a um fecho da economia durante décadas, sendo a agricultura ao mesmo tempo altamente protegida e baseada em condições de trabalho deploráveis para a maioria dos trabalhadores rurais. Mas noutros países africanos, a globalização também gerou uma enorme necessidade de aprender a lidar com o exterior mais desenvolvido. Nalguns casos com sucesso e altas taxas de crescimento económico.
No entanto, o desenvolvimento é geralmente desigual e o aparecimento de uma classe média, que para o mundo desenvolvido surge como uma oportunidade, em certas regiões gera situações de grande dependência do exterior. Por exemplo, as classes médias cada vez mais urbanas são consumidoras de bens alimentares transformados como sumos de fruta ou café solúvel. No entanto certos países produtores e exportadores de fruta e café não têm indústrias transformadoras, vendo-se obrigados a importar de volta os seus produtos transformados, a preços elevados.
Numa época de tantos extremismos e nacionalismos, penso que vale a pena olhar para estas diferentes perspectivas.
Um resumo do livro pode ser lido aqui.
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