O continente Africano costuma ser apresentado como recordista da pobreza, campeão da exclusão social, e do falhanço do desenvolvimento económico e social. Em África encontram-se dos países não só mais pobres do mundo, em rendimento, mas com carência de educação e saúde.
Quem já visitou África, ou lá viveu, não pode ficar imune à riqueza potencial da sua biodiversidade, dos seus minerais, do petróleo, dos recursos sustentáveis como água e o vento.
O livro de Martin Meredith, um dos especialistas e scholars, que lá viveu mais de 50 anos dá-nos uma história radical do continente desde 1900, 1950 a 2000. Começa com uma célebre frase de Plínio “O Velho” historiador romano: “De África surge sempre algo de novo”.
Na nova ordem mundial emergente, pós-pandemia Covid19 e com a quebra da hegemonia unipolar americana, a China tem explorado o Continente de Norte a Sul. Dambisa Moyo, no seu livro Dead Aid descreve como pela primeira vez a ajuda chinesa permitiu fazer a primeira estrada de asfalto de Norte a Sul de África. A zambiana tem uma visão critica da ajuda ocidental e da Chinesa, tendo ela sido formada nas escolas de topo americanas, e tendo inclusivamente chegado a trabalhar na Goldman Sachs em Nova Iorque.
A Áfríca do Sul, do pós-apartheid, herdeira de De Klerk e de Mandela, de Zuma e de Mbeki tem mantido a dominância do Continente. Mas a China veio para ficar, com a sua estratégia de credito barato não pagável, e com a sua armadilha do crédito -.veja-se o que se passou no porto de Sri Lanka, onde os habitantes ficaram reféns de um armadilha de divida. Ou o modelo Chinês replicado nas fábricas de sapatos com mão-de-obra etíope para o Made in China para todo o mundo.
Mas então e a Agricultura, a Agroecologia e a Revolução verde em Africa?
Um relatório recente chamado False Promises, avalia o progresso da AGRA- Association for A Green Revolution in Africa. Avaliam quatro países com dados de produtividade concretos, Zâmbia, Tanzânia, Quénia e Mali.
Os resultados da revolução verde (green revolution) que teve um papel decisivo nos anos 60 e 70 do século XX na Europa e nos EUA e na América Latina foi o modelo agora exportado para África.
Esta Associação chamada AGRA- Association for Green Revolution in Africa, revela entre 1998-2006 resultados desastrosos, e não apenas em uma matéria de opinião, mas sim conseguiu-se quantificar a alternativa.
A alternativa à revolução verde chama-se de facto, agroecologia, práticas sustentáveis. De algum modo recuperar a tradição da terra, evitar sobre-exploração, usar práticas de facto ecológicas. O planeta terra e a humanidade agradece, mas a melhor lição de todos para nós europeus, africanos, e cidadãos do mundo é a de que a produtividade nestes países em causa, pós revolução verde trocando essas práticas por práticas de agroecologia,, os ganhos de produtividade diretos foram incomensuráveis.
Exemplo: a produtividade da revolução verde com sementes geneticamente modificadas que a AGRA prometia: chegar aos pequenos agricultores africanos, duplicar-lhes a produtividade, assegurar-lhes estabilidade de rendimento, nada disso foi alcançado em mais de uma década.
Este estudo recente aponta, no entanto, uma luz forte de esperança: a agroecologia- as praticas ancestrais, preservadoras do ambiente, levaram que em experiências piloto, a produtividade da agroecologia em Africa seja mais de 80% superior em certas zonas, noutros casos concretos os ganhos de produtividade da agroecologia africana face à revolução verde da AGRA chega aos 120% a 160%.
Boas notícias portanto! Os Europeus, os Americanos e os latino-americanos têm muito a aprender com África. A agroecologia parece de facto a única via sustentável e é rentável.
Se a Agroecologia é bem sucedida em Africa como clausula de escape da pobreza para pequenos agricultores e não só, porque não aplicá-la em larga escala?
Fica aquio desafio. Em termos de modelo de desenvolvimento chama-se leap froging, ie saltar etapas de desenvolvimento. Mas chamar-lhe-ei leap frogging with a boomerang effect. Porque após o salto, o tal salto do sapo, voltámos atrás e construimos uma economia, uma agronomia mais resiliente, baseada na experiência passada aprendo com os erros de desenvolvimento dos outros modelos experimentalistas mal desenhados.
Naturalmente a questão da posse da terra também não é despicienda, sendo em Moçambique, ou nos antigos bantustãos sul africanos – veja-se o nosso Pereira et al. (2017).
Sobre a estrutura global politica económica da posse da terra em Àfrica, veja-se, Ambreena Manji, tendo em atenção que a China tem adquirido milhões de hectares, fazendo verdadeiro land grabbing.
Para os cidadãos e para o mundo: a agroecologia, um sinal real de esperança, em tempos de pandemia Covid19, com a incerteza do domínio chinês.
Miguel Rocha de Sousa, Economista do Desenvolvimento e Macroeconomista,
Universidade de Évora, Professor Auxiliar.
Para ler:-
Relatório False Promises
Pereira, L. B., Melo, A. P., Duarte, V., & de Sousa, M. R. (2017). Apartheid, Globalization and Agriculture. in Globalization and Agriculture: Redefining Unequal Development, 229.
Manji, Ambreena (2006). The politics of land reform in Africa: From communal tenure to free markets. Zed Books.
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